Martins&Montero apresenta a exposição “Passantes”, da artista Lia D Castro, que será inaugurada no dia 01 de abril. A mostra apresenta obras inéditas e propõe uma revisão crítica da história da arte, desafiando as noções tradicionais de representação, inclusão e identidade.
Em sua nova série, Lia D Castro parte de um gesto simbólico: a compra de pinturas com os temas de naturezas-mortas e paisagens em antiquários, sobre as quais intervém ao pintar pés masculinos. Esses pés pertencem a homens que foram criados por mulheres — mães, tias, avós —, dentro de um sistema matriarcal. A proposta de Castro inclui, ainda, um jogo visual que desestabiliza a leitura comum desse gênero de pintura ao posicioná-las de ponta cabeça, criando um contratempo ótico que nos convida a olhar para o trabalho de arte sob um novo ângulo. Essa inversão também sugere uma releitura do museu e da própria história da arte, desafiando a persistente “retina colonial”, termo utilizado pela artista para descrever o olhar eurocêntrico que moldou a produção e a recepção das imagens ao longo dos séculos.
A inserção desses elementos em naturezas-mortas não apenas subverte a percepção inerte e contemplativa dessas composições, mas também instiga uma reflexão profunda sobre a necessidade de revisitar paradigmas artísticos historicamente cristalizados. Ao deslocar a leitura tradicional dessas imagens, Lia D Castro estabelece um campo dialógico no qual a ressignificação emerge como força motriz de um discurso estético que desafia tradições e amplia as fronteiras da arte contemporânea.
Inspirada no pensamento do filósofo Achille Mbembe sobre a condição do estrangeiro como “passante”, Lia D Castro reflete sobre fronteiras, limites e exclusões. Seu trabalho resgata uma longa tradição de representações, que à primeira vista podem parecer comuns, mas que carregam em si a complexidade das dinâmicas sociais e políticas. As obras em exposição são um comentário poderoso sobre o impacto do colonialismo ocidental nas práticas e normas culturais e históricas da arte.
A exposição provoca o espectador a questionar interseções entre privilégio, vulnerabilidade e poder. Castro nos convida a enxergar a arte para além das narrativas dominantes e a reconhecer as experiências daqueles que foram historicamente marginalizados. Em sua obra, há uma delicadeza intrínseca, uma sensação de intimidade e ternura que perpassa até os temas mais desafiadores.